Veterinários
Era uma vez um Boxer
Era uma vez um boxer que nasceu fraquinho. Ele era o menor da ninhada e seus irmãos não o deixavam mamar. Sobreviveu como pôde e no final do desmame os mais fortes foram embora, e ele morou com o papai e a mamãe. Difícil era a vida até então mas a ração ele já conseguia comer sem disputar.
Até que uma noite estava frio e ele dormiu embaixo daquele carro bem quentinho. No sono profundo ele não percebeu que o carro ia saindo até quando passou por cima dele acidentalmente. Os mestres do papai e da mamãe prontamente levaram o refuguinho para o doutor, que tratou de colocar as "peças" no lugar. Acharam que não fosse sobreviver e ele pensava "não, gente, ainda sou bebê, ainda tenho que brincar, ai ai ai... tá doendo... bola? isso é uma bola? ahhh, não consigo brincar agora, vou dormir, amanhã eu brinco". E decidiram chamá-lo Bolinha.
E o Bolinha cresceu. Não corria como os outros mas corria como podia. Brincava, o tempo todo que estava acordado, cheirava os cantos, as pessoas, as plantas... mas não mais os carros. Corria com uma cadência própria, meio de lado, como se mancasse e rebolasse mais que qualquer outro boxer.
Então um casal de mestres resolveu levá-lo para outra casa. Agora a casa era só dele. E ele tinha um espaço enorme para cheirar e descobrir, e novos mestres para amar. Então depois de pouco tempo chegou outro cachorro, todo desarrumado. Ele parecia ter nascido errado porque não tinha o focinho achatado: "Veio estragado de fábrica", pensou o Bolinha, e seus mestres resolveram chamá-lo de Pequeno.
Um dia o Bolinha ficou com um dodói na cabeça, que coçava, coçava, e nunca sarava. O mestre levou no doutor de novo que tratou de dar para o Bolinha o capacete mais legal que qualquer boxer poderia ter. Era difícil dormir ou comer no início, e se antes o Bolinha não identificava de onde vinha o chamado, agora então que era mais complicado. Mas o Pequeno invejou aquele capacete e o Bolinha se sentia mais especial. A mestra insistia em chamar aquilo de colar elizabetano, e o Bolinha pensava "colar é coisa de menina, isso é o capacete da sabedoria".
Todos os dias os mestres passavam pomada no dodói para melhorar e quando eles se afastavam o Bolinha perguntava para o Pequeno: E aí, melhorou o dodói?
"Não, não sei, não dá pra ver, tem uma coisa branca em cima, deixa eu lamber pra tirar"....... "pronto, tirei... não, Bolinha, não melhorou ainda, mas tá quase."
Então a irmã do mestre, que também era doutora, falou que o Bolinha tinha que tomar um comprimido duas vezes por dia, e usar o capacete da sabedoria mais tempo. Mas também ela era ruim, furou o Bolinha, tirou sangue dele para fazer um exame e os mestres ficaram apreensivos. O Bolinha agora chamava os remédio de pílulas do poder. E o Pequeno não tinha inveja, mas muita admiração por aquele irmão mais velho.
Depois de uns dias os mestres do Bolinha estava muito felizes, o dodói já havia sarado e eles abraçaram os dois, dizendo: Que bom Bolinha, você não tem leishmaniose, que felicidade. O Bolinha pensava: "Mas é claro que eu não tenho, ninguém me deu isso, você tem, Pequeno?"
"Não, Bolinha, não tenho também, ahh, ninguém me dá nada".
E eles continuaram o dia a dia, agora sem o capacete da sabedoria ou os comprimidos do poder mas o Bolinha havia completado o ciclo do crescimento, era oficialmente o chefe daquela matilha de dois cães, e um gato como intruso.
A mestra até que deixava o bando entrar em casa quando o mestre não estava, mas eles sabiam que deveriam sair e cuidar de todo espaço lá fora. Essa era a função deles. Cuidar da casa que lhes dava tanto amor.
Então uma noite os mestres saíram e os deixaram em casa. Já estava bem tarde quando o Bolinha ouviu um barulho. Era alguém entrando na casa deles, sem ser convidado. Um convidado nunca tentava entrar pela janela, e o Bolinha não pensou duas vezes quando mordeu aquele homem indesejável. Na verdade considerando a raça, o Bolinha nunca pensou duas vezes em nenhum momento na vida.
O homem então gritou, tentou afastar o Bolinha, que chamava de boca cheia: "Vemm Pequeno, não deixe esse homem entrar na nossa casa." até que PÁ!. Foi um barulho muito alto, e o Bolinha sentiu uma fisgada no pescoço.
Com a boca cheia se sangue, sem saber se era dele ou do homem, ele não soltou, e o homem ainda gritava quando o Bolinha enfraqueceu e o deixou partir. "Vem Pequeno, vamos atrás dele, ele não pode fugir"... mas o homem já ia bem longe, e o Bolinha ficou cansado.
Já bem distante da casa, os dois viram quando o homem ia embora e o Bolinha sentou-se. "Vamos ficar aqui, Pequeno, vigiando, ele pode voltar"
"Bolinha, aquele homem te machucou"
"Não importa, Pequeno, senta do meu lado que eu vou te contar uma história....
Nem sempre eu fui o chefe da matilha, na verdade eu era o menor de todos e ninguém acreditava que eu fosse sobreviver. Quando o carro passou por cima das minhas pernas eu fui levado para um doutor que me deu um remédio para dormir enquanto me consertava. Nesse dia eu sonhei com um homem que me disse: 'Bolinha, seja forte, porque você tem uma missão. Você vai ter uma vida mais difícil, mas será muito feliz. Você vai viver com uns mestres que te amarão profundamente e vão cuidar para que você cresça forte e saudável. Bolinha, na verdade você será o dono deles e terá que cuidar deles para sempre. Um dia vão tentar machucar os seus mestres, invadir a casa deles e será sua missão não deixar que isso aconteça. Bolinha, se você falhar, o homem ruim vai esperar seu mestre voltar para casa e machucá-lo muito, e cabe a você não deixar que isso aconteça. A sua vida na Terra, Bolinha, vai ser abreviada nesse dia, mas você continuará presente como um anjo daquela família. Lembre-se Bolinha, seja forte, você não pode falhar.'
E foi assim Pequeno, por isso que eu sempre usei o capacete da sabedoria, e tomei as pílulas do poder. Para ser forte e hoje passar para você a sua missão. Eu agora preciso dormir, estou cansado, fique aqui do meu lado, fique vigiando esse lugar. Agora, Pequeno, eu passo para você a missão de cuidar dos mestres. Na terra. E eu estarei presente também, você só não vai me ver sempre, mas de vez em quando. Se bobear, eu como a sua ração... eh eh eh."
"Entendi Bolinha, chega pra lá, vou deitar aqui do seu lado, fico com você até você dormir. E quando o mestre chegar eu vou contar para ele onde você está, para que ele possa te levar para casa."
Este post foi dedicado ao meu irmão e sua esposa, que perderam seu companheiro, o Bolinha, na madrugada de 18/09/2010, em uma tentativa de assalto. Sejam fortes e lembrem-se que ele estará sempre presente.
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